Tom Morooka
As cotações do minério de ferro no mercado internacional despencaram nada menos de 29,04% nos últimos 30 dias. A tonelada da commodity, que valia US$ 217,30 há um mês, foi cotada por US$ 153,40, ontem, dia 18, o menor preço em seis meses.
A queda em agosto chega a 15,5% e o desempenho no ano também virou para negativo, uma baixa de 4,40%. Outras commodities experimentam o mesmo comportamento nos preços. Mas o que estaria ocorrendo?
Com as seguidas e recentes desvalorizações, o preço da tonelada do minério ficou menor que o do início do ano, quando esteve valendo cerca de US$ 164. Apesar das quedas, o valor atual é quase o dobro da média das cotações dos últimos anos, ao redor de US$ 70 a US$ 80 a tonelada.
Impacto nas ações da Vale
A rápida e forte desvalorização do minério impactou as ações da Vale, a principal exportadora brasileira da commodity, que tiveram acentuada queda no período recente. O papel da mineradora acumulou baixa de 9,03% nos últimos 30 dias, dos quais a metade, 4,50%, em agosto.
No ano, acumula valorização de 26,41%, enquanto o Índice Bovespa (Ibovespa), índice em que a mineradora tem participação relevante, recua 2,00%.
O Índice de Materiais Básicos BM&F Bovespa (Imat B3), que reúne 13 empresas diretamente expostas às commodities, acumula queda de 6,02% em 30 dias (-4,84% em agosto), puxado principalmente pelo desempenho ruim de Vale (VAL3), Gerdau (GGBR4), que cai 5,12% em agosto, e Companhia Siderúrgica Nacional (CSNA3), que despenca 13,75% no mês.
Apesar da queda do minério e de seus impactos sobre as ações de Vale, especialistas continuam otimistas com a mineradora. Ponto comum das análises é que nenhum aponta para um início do fim do ciclo das commodities.
Consideram a desvalorização um movimento pontual, associada a alguns fatores, como restrições regulatórias adotadas pela China, avanço da variante Delta do coronavírus e, com ele, dúvidas sobre a retomada da economia global na velocidade esperada, dentre outros.
Restrições da China interferem nas cotações
Vitor Santos, especialista da Valor Investimentos, diz que o minério vem atingindo níveis mínimos de preço pressionado pelo aumento de estoques na China em meio a restrições à produção de aço adotadas pelo governo daquele país. Ele aponta ainda uma série de medidas de controle chinês sobre o setor imobiliário, que demanda grande consumo de aço.
“O controle sobre a produção de aço e seu uso na construção civil faz com que a demanda pelo aço fique menor e isso joga o preço para baixo”, reforça Davi Lelis, outro especialista da Valor Investimentos.
O economista da Messem Investimentos, Gustavo Bertotti, destaca também as restrições chinesas como um dos principais fatores de correção do preço do minério.
Ele lembra, contudo, que a propagação da variante Delta contribuiu para agravar as perspectivas para o mercado de commodities, ao lançar dúvidas sobre o ritmo de retomada de atividade.
Thomas de Mello e Souza, portfólio manager da Atlas One Investimentos, atribui o recuo do preço do minério a uma acomodação de oferta e procura, após uma expectativa frustrada de demanda forte. Momento em que uma perspectiva de reabertura da economia criou um clima de euforia e impulsionou os preços da commodity.
A demanda continua relativamente aquecida, mas a expectativa é que a oferta se normalize gradualmente, avalia Mello e Souza, para quem eventual retorno da tonelada para US$ 100 não seria de todo ruim para a Vale. “Apesar da queda forte, o preço do minério está ainda em um patamar bastante alto.”
Correção de preços em todas as commodities
Em sua avaliação, o que a Vale está passando é o que ocorre, em menor escala, com as commodities em geral, das metálicas às agrícolas, uma correção gradual de preços depois de chegar ao pico.
Mello e Souza não vê mais potencial de valorização que a ação da Vale teve antes de começar a atual trajetória de queda.
Para ele, “a mineradora está com saúde financeira sólida, deve gerar bons resultados, mas não tão bons quanto já apresentou”, avalia. Previsão que ele estende a outras empresas do setor, como Usiminas, Gerdau e CSN. “A alta já aconteceu, o momento de Vale em atratividade passou.”
O especialista Vitor Santos, da Valor Investimentos, se declara otimista não apenas com a Vale, mas também com as demais siderúrgicas com parcela relevante da receita derivada de vendas de commodities ao exterior, como Gerdau, Usiminas e CSN.
Acreditando em uma correção normal de preços e não em uma reversão de ciclo de commodities, Santos afirma que “o mercado olha à frente projetando bons fluxos de caixa, o que essas empresas de commodities devem continuar proporcionando”, prevê.
“O setor passa por correção, mas os fundamentos das empresas mostram crescimento de receitas, resultados e lucros acima das expectativas nos balanços e isso deve ser avaliado pelo investidor”, comenta Bertotti, da Messem Investimentos.
O economista lembra ainda que as siderúrgicas têm papel fundamental no consumo interno e podem ser beneficiadas pela recuperação da atividade e crescimento econômico.
Uma avaliação positiva que ele estende a outras empresas do segmento que passam por correção pela aversão ao risco, como as de commodities agrícolas e celulose, e têm possibilidades de ser sustentadas também pela demanda doméstica.